domingo, 5 de julho de 2009

A carta que Não Entreguei a Luis Filipe Vieira

Caro Presidente:
Quando se pensa na gestão de um clube com a dimensão do Sport Lisboa e Benfica temos de ter em consideração 3 pilares:
1. As infra-estruturas;
2. A situação económica;
3. As modalidades (onde o futebol é o principal agente criador de receitas).
Nas primeiras duas, parece-me que os feitos realizados, à vista de todos, são inegáveis. O novo estádio (com todos os pavilhões na sua envolvente), o centro de estágio do Seixal - Em termos de infra-estruturas, digam o que se disser, estão lá.
Em termos económicos, o Benfica tem hoje crédito bancário, consegue e pode negociar jogadores, o que num passado recente não era possível.
Sou sócio desde cedo, interrompi as minhas obrigações, em 1987, por morte do meu pai, e necessário ordenamento das prioridades financeiras de uma família de classe média, que se viu privada, cedo demais, daquele que entre tantas outras coisas era a fonte de receitas da família. Voltei a ser associado em 1999 e até hoje mantenho as quotas em dia, sendo nos últimos 5 anos detentor de um lugar cativo no Estádio Da Luz.
Embora me tenha estado afastado enquanto sócio mantive-me sempre perto daquele que é o meu clube de coração. Acompanhei as glórias e os longos tempos de privação e delapidação do património Benfiquista. Mas, como sempre, acreditei que entre nós encontraríamos a solução.
E o melhor projecto e solução tem sido construído e personificado por si e pela sua equipa, desde que chegou à presidência do Clube.
Vejo hoje em movimentos de sócios, legítimos, caras que ajudaram no processo de delapidação do clube. Temo que estes movimentos sejam apenas o “ cavalo de Tróia” de outros que pretendem saquear aquilo que já construímos. Como dizia o Dr. Fernando Seara (meu professor na faculdade), “temos memória”.
Aos seus anos de gestão do clube devemos o lavar da cara, devemos o dignificar e valorizar uma das marcas grandes deste país.
Com programa estruturado de parcerias ganhámos apoios, e entrámos em vários sectores económicos do país.
Ao denunciar os escândalos que só a justiça ainda não encontrou provas, afastou-nos de processos pouco claros que, pelos vistos, geriam (e se calhar ainda gerem) os interesses do futebol em Portugal.
Ao separar o Benfica desses processos, deu-nos mais credibilidade quando nos sentamos a uma mesa para negociar a mais pequena coisa, deu um sinal claro que, para esse tipo de coisas, não contem com o Benfica.
O Benfica renasceu como o fará sempre, porque não se consegue parar a força motriz de base de um clube feito de trabalho, fé e entrega de todos, para o proveito do colectivo.
Outros projectos foram executados:
A renovação da identidade do clube de forma visível, através dos meios de contacto com os sócios e o esforço de uniformização das casas do Benfica.
A defesa do ecletismo, de forma sustentada, sendo cada modalidade auto suficiente, e não um sorvedouro do futebol como aconteceu durante anos.
O papel social que o Benfica tem e deve ter ganha rosto nas acções de responsabilidade social em que se envolvem jogadores e figuras proeminentes do clube.
Várias gerações de atletas encontram aqui as condições para a prática das modalidades que entendam, absorvendo ainda valores formativos de base – espírito de equipa, conquista de objectivos, desportivismo e respeito.
Não fico preso em objectivos não conseguidos, ou frases ditas em momentos em que foi necessário levantar o orgulho Benfiquista. Mas é preciso fazer acontecer o maior desafio do todos – Trazer o futebol profissional às vitórias. E aí é a sua área de trabalho para os próximos 3 anos. É necessário cerrar fileiras em torno desse factor. O balneário tem de estar fechado ao exterior. A equipa tem de deixar a pele em campo. A massa associativa, aplaude uma equipa que perde, desde que a sinta dar tudo em campo. A massa associativa aplaudiu de pé alguém que nada nos deu, e que no último jogo contra o Belenenses sem medo olhou o adepto de frente e o mandou levantar a cabeça.
Vou ter saudades da postura de Quique. Foi um senhor.
É fácil teorizar sobre os pontos atrás referidos. É o seu desfio colocar isto na prática, em nosso nome. Para além das capacidades de gestão, é necessário estar atento a vários palcos, onde surgem os mais variados desafios (ter boa imprensa, isolar os jogadores desviantes, manter a coesão do grupo de trabalho, etc.) – Parece fácil, mas não é, tenho consciência disso, mas é urgente que aconteça.
Porquê a urgência:
Com o sucesso desportivo no futebol, as receitas aumentam.
Se as receitas aumentam, diminui a exposição ao crédito, aumenta a sustentabilidade dos projectos e a nossa autonomia.
As vitórias são a melhor publicidade do mundo. É angariação directa de apoios nas mais diferentes áreas.
A segurança financeira permite defendermo-nos de falsos Messias com soluções milagrosas, que já tivemos e não queremos de volta. Atrás destes falsos Messias estão, habitualmente, actores com quem não queremos dividir o Benfica. A massa associativa pode ser de origem simples e humilde (com muito orgulho), mas de burra tem muito pouco ou nada.
É necessário que os resultados que as camadas jovens do Benfica apresentam sejam bandeira na equipa principal. O público da Luz não perdoa o erro, mas reconhece as virtudes dos lutadores. – Miguel Victor é bem exemplo disso. Temos de continuar.
Traçar objectivos de curto prazo mas visíveis para todos – ter 2 a 3 jogadores dos juniores a trabalhar com a equipa principal e a crescerem aí.
Continuar a política de saídas de 2 a 3 jogadores por ano e contratação de outros tantos. Evitar reinventar a equipa todos os anos.
O treinador é um bem essencial, o pólo aglutinador em torno do qual devem ser reunidas todas as condições para que possa desenvolver a sua actividade em prol do objectivo comum – o título nacional. Com esse os outros títulos virão naturalmente.
O relacionamento com as claques deve ser revisto, quando estas se legalizarem. Elas foram motivo de orgulho sobretudo no último ano. Quando apoiam o tempo inteiro a sua equipa sem nunca falarem de outros clubes. Fomos diferentes e fomos exemplo, oxalá outros nos sigam nesse exemplo de civilidade. Eles são um dos actores do espectáculo fora das 4 linhas e têm sido incansáveis no apoio à equipa. É importante que as claques entendam que o Benfica não pode servir de escudo para qualquer outro fim que não seja o apoio à causa Benfiquista. É necessário que as claques entendam que o Benfica não é um escudo debaixo do qual tudo é permitido. Para que esta sombra se dissipe é necessário que as claques se legalizem.
Seria injusto não fazer referência a um dos pilares que lhe conferiu solidez na sua gestão, o caro Domingos Soares de Oliveira, um profissional de mão cheia, que honra aqueles que o contrataram. A demonstração de que podemos ter um dos melhores profissionais na sua área a trabalhar com e para o Benfica.
Enquanto sócio, acredito na obra visível e invisível, feita ao longo dos seus mandatos. Houve erros mas só quem nada faz é que não erra. Continuo a acreditar que o seu papel e o da sua equipa de gestão ainda não terminou, continua a ser necessário ao Benfica.
Desejo-lhe as maiores felicidades no exercício das suas funções ao serviço do Benfica. Que lhe sejam confiados, a si e à sua equipa, os destinos do clube pelo menos por mais 3 anos.
Viva o Benfica
Com os melhores cumprimentos,
João Borges de Carvalho
Sócio: 51.314

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